Para a diretora Kitty Kiffer, o filme é mais um registro da cidade que coleciona pioneirismos
Por: Jhonatan Mata
A “Princesa de Minas” é hiperativa e coleciona primeiras vezes: teve a primeira transmissão de imagem em circuito aberto do Brasil, a primeira hidrelétrica e também rodovia pavimentada da América do Sul, o primeiro Cristo Redentor do país e até a polêmica primeira partida de futebol. Para além desses feitos, é precursora nacional dos festivais de rock, tema do documentário “Qual é o Bizzu? Marcos Petrillo e a expansão da cena rock nos anos 1980”. A obra, que está em fase de finalização, terá trecho especial exibido no dia 04/12 no Erecom 2024. A produção- dirigida por Kitty Kiffer e co-produzida pela Faculdade de Comunicação da UFJF, com supervisão do prof. Cristiano Rodrigues- expõe a explosão de criatividade e diversidade musical, através de imagens históricas de 4 festivais de rock realizados em Juiz de Fora e produzidos por Marcos Petrillo.
O festival inicial, realizado em 1983 no campo do Sport Club é considerado o primeiro festival de Rock Brasileiro. Marcos, com seu amigo e parceiro Fábio Ribeiro, se inspirou na vocação cultural da cidade e lançou em 1982 um fanzine, a revista“ Bizzu” para divulgar o rock e os temas relacionados à contracultura. A partir da sua relação com a equipe do Circo Voador, no Rio de Janeiro, onde frequentava as noites do “ Rock Voador”, o trabalho com o zine evoluiu para os festivais de rock que inseriram a juventude de Juiz de Fora na cena cultural que movimentou aquela década impactando gerações em toda a nossa região. O Sinestelas conversou com a diretora Kiity Kiffer e o bate papo completo você confere abaixo
Jhonatan Mata: Qual a sensação/importância de divulgar trecho da obra na Facom?
A Facom é a minha casa, onde me formei em 1993. É uma satisfação enorme estar aí de volta, retornando aos estudantes que estiveram comigo e com Alex Aguiar (idealizador do filme) nesse projeto. O Cristiano Rodrigues é meu amigo, formamos juntos. Foi a nossa geração, a nossa turma que inaugurou na cantina da Comunicação as "Sextas Culturais". Nosso vínculo de amizade permanece até hoje. Quando o Cristiano me colocou em contato com a diretora Erica e ela se interessou pela parceria foi um grande avanço e retomamos a produção. O Cris foi muito habilidoso ao convidar estudantes que poderiam ter um interesse real no projeto e que abraçariam a oportunidade com seriedade. Foram 4 externas e um total de 13 entrevistas.Para mim e para o Alex, dividir o set das gravações com a Facom foi sempre um prazer e um aprendizado para todos, sempre. Quem é do audiovisual sabe o quanto é prazeroso encerrar o dia de gravação com positividade e muitas ideias na cabeça...no doc a gente já grava (quase) editando o conteúdo e foi muito satisfatório trocar com os estudantes as impressões sobre o quanto rendeu ou não determinado depoimento, etc. Mesmo após o final das gravações algumas pessoas seguiram com a gente dando suporte na decupagem e pré-edição, sugerindo cortes de conteúdo inclusive, foi uma boa interação. Em muitos momentos dessas caminhadas, esgotados, a gente desanimou mas nunca desistimos de conseguir fazer a homenagem em Palma. Era urgente levar este presente ao Marcos Petrillo e conseguimos. Agora é a vez de a gente curtir juntos esse corte do documentário que já evidencia sua potência e importância para Juiz de Fora e toda a região.
Produzir audiovisual é caro. Quais os desafios de se produzir um documentário de 68 minutos e poucos recursos em termos de investimento financeiro?
O importante pra nós, que estamos há um ano e meio nesse projeto sem remuneração, é destacar que esse é um projeto em produção que ainda vai ser contemplado em edital para poder ser finalizado corretamente. Há muito a ser feito da pesquisa à (re) gravação de algumas entrevistas, estauro de imagens e, em especial, para que o filme possa rodar mostras e festivais e ter um lançamento oficial em JF, falta a Produção Executiva ajustar todos os detalhes relativos ao direito de imagens dos artistas para este filme.
Quando o Alex trouxe a ideia deste projeto, abracei imediatamente e, sem apoio ou patrocínio, seguimos firmes contando com amigos, pedindo muitos favores mas percebendo , a cada novo contato, o quanto o nome do Petrillo abriu as portas com os artistas que o conheceram naquela década. Quando em abril de 2023 visitamos Marcos Petrillo em Palma , sua cidade natal, para conhecê-lo pessoalmente e explicar a ideia da homenagem, entendemos que não seria possível aguardar seleção em edital por causa do seu delicado estado de saúde. Paralelo à produção que seguia fluindo através dos contatos facilitados pela minha carreira na editoria de cultura no Rio de Janeiro (foram 23 anos por lá) eu precisava resolver o principal: realizar as entrevistas em Juiz de Fora com os artistas locais que participaram dos seus festivais, com jornalistas e produtores que trabalharam ao seu lado.
Jhonatan Mata: Uma questão que importa muito aqui pro Sinestelas é esse lugar da “visualização da música” estudado pelo saudoso Arlindo Machado. Vocês abordam especificamente eventos de música dos anos 1980, mas também passamos no momento por um boom de artistas do mainstream(ing) que vêm para o Brasil divulgar seus trabalhos, em turnês individuais ou festivais como o Rock in Rio, apostando no potencial de espalhamento (sobretudo vias redes sociais) do público e dos fãs brasileiros. Qual sua opinião a respeito dos diálogos e desafios entre áudio e vídeo, a dimensão da imagem em suas relações com o som e especificamente a música?
O filme é um registro relevante da memoria sociocultural da nossa cidade que coleciona vários pioneirismos e, nos anos 1980, não seria diferente, eram os tempos de abertura política e a juventude vibrava por liberdade e criatividade ao se expressar, na poesia, no teatro, na música, nas artes. Então, além de homenagear o Marcos Petrillo, um produtor pioneiro que virou uma página na cena cultural da cidade, impactando toda a região, este também é um filme para todos que gostam de música e se orgulham de Juiz de Fora, um cidade que é polo na região, mas se destaca especialmente na vida cultural. Como atuei trabalhei dos 23 aos 42 na editoria de cultura da extinta TVE Rio, hoje TV Brasil, tínhamos muita liberdade editorial , até pela visão do meu querido diretor Wagner Correa de Araújo, do programa Caderno 2. Com ele e uma equipe muito afinada. participei e contribuí divulgando na TV alguns movimentos como a retomada das rodinhas de samba de raiz nos antiquários da Lapa, o surgimento de bandas emblemáticas como o Planet Hemp, o Rappa e a cena mangue beat e a cultura hip-hop. Nessa, entrevistei Mano Brown em Vigario Geral, numa visita que fizeram ao Afroreggae em 1997. Esse encanto da música criando através do ritmo e da poesia uma identidade que nos une, é o que me encanta e vai sempre me inspirar a contar histórias em torno dela. Foi assim que fiz também o primeiro especial sobre hip-hop veiculado em TV aberta em janeiro de 1998 na extinta TVE Rio.
Commentaires